Artigo publicado no Jornal de Cristalina de outubro de 2013 |
segunda-feira, 21 de outubro de 2013
segunda-feira, 7 de outubro de 2013
Operação Miqueias: Falhas abrem portas para desvios
Operação Miqueias
Falhas
abrem portas para desvios
Falta de fiscalização e influência política
nos institutos de previdência facilitam caminhos para a corrupção
Fabiana Pulcineli e Thaís Romão
06 de outubro de 2013 (domingo)
Junte muito dinheiro disponível a uma boa
dose de influência política. Acrescente fiscalização falha e ineficiente. São
os ingredientes que compõem a receita para fraudes e prejuízos a institutos de
previdência de servidores públicos em todo o País.
Os números são expressivos: R$ 156 bilhões de
patrimônio do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) em 2011 (veja
quadro). As aplicações no mercado financeiro naquele ano somaram R$ 54 bilhões.
Em Goiás, apenas nos meses de março e abril deste ano, os investimentos em
aplicações somaram R$ 1,3 bilhão. De outro lado, mais de 6,5 milhões de
contribuintes sob o risco de ver seu dinheiro escorrendo pelos ralos da
corrupção.
Alvo da Operação Miqueias, deflagrada em 19
de setembro, os esquemas que envolvem aplicações dos recursos dos fundos de
previdência expõem as brechas do sistema. As facilidades para os corruptos são
reforçadas pela delegada da Polícia Federal que coordenou a operação, Andréa
Pinho Albuquerque, ao admitir, diante dos indícios da existência de outras
quadrilhas com atuação no mesmo ramo: “Nós pegamos apenas a ponta do iceberg”.
A operação apontou suspeita de desvios de R$
50 milhões. Em Goiás, de acordo com o inquérito, a quadrilha articulou
aplicações de fundos em pelo menos 17 cidades. Para isso, se aproximavam de
lideranças políticas, deixando clara a ingerência nos institutos.
Os RPPS são autarquias e, em tese, devem ter
total independência política e financeira para garantir o seu bom
funcionamento. No entanto, as nomeações para os institutos entram quase que
sempre na distribuição das cotas partidárias na gestão dos Estados e
municípios.
As leis complementares que tratam do
funcionamento dos fundos não estabelecem critérios para as indicações. Em
alguns casos, há uma cota para servidores em cargos de direção. Para o
conselho, a quem cabe aprovar as decisões do presidente, também é garantida
cadeira para um representante do funcionalismo. Os principais cargos, porém,
são de livre nomeação dos prefeitos ou governadores.
A legislação determina que os gestores dos
institutos façam um curso sobre previdência. Mas a reportagem apurou que muitos
deles atropelam a exigência. No caso do Estado, o gestor tem de ter curso
superior. São apenas essas as exigências.
Como as decisões dos institutos cabem aos
gestores e aos conselhos, a maioria dos prefeitos de municípios goianos citados
na operação argumenta que não tinha conhecimento das aplicações suspeitas.
Questionado sobre as operações realizadas no
apagar das luzes da gestão do ex-prefeito Velomar Rios (PMDB) em Catalão,
apontadas como irregulares pela PF, o peemedebista disse que o prefeito só
nomeia, mas não acompanha as atividades do instituto. “Não tenho detalhes
destas últimas aplicações do fundo de previdência de Catalão. A verdade é que,
embora o prefeito nomeie o gestor da previdência municipal, ele conta com um
conselho com múltipla representatividade que fiscaliza e aprova as aplicações
do fundo, que tem de obedecer regras fixadas pelo Ministério da Previdência.
Então o prefeito não participa diretamente destas decisões. Mas quero crer não
houve nada de errado. Tanto que nunca fomos informados de qualquer problema. E
fico surpreso de haver no mercado fundos que podem lesar os servidores sem que
o sistema financeiro tome providências para impedir a atuação deles”, disse.
A prefeitura de Aparecida de Goiânia, também
citada na operação, informou em nota que o gestor do Aparecida Prev suspeito de
irregularidades, Sebastião Ramoncito, foi demitido porque não cumpriu a
determinação do prefeito de investir apenas em fundos de investimentos
administrados pelo Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal.
“Em tese, a legislação determina autonomia da
Previdência. Mas na prática há influência. Então os prefeitos usam isso a seu
favor. Quando questionados, para se afastarem do problema, afirmam que não têm
nada com isso. Mas na prática é diferente. Se o gestor é aliado político do
prefeito, ele atende às determinações do prefeito também”, diz um especialista
em Gestão Pública, que presta consultoria aos municípios e prefere não se
identificar.
Fiscalização
Já que prefeitos passam a bola para gestores
e conselheiros, caberia aos órgãos fiscalizadores o monitoramento e o
impedimento de operações temerosas nos institutos. Mas a falta de equipe e a
complexidade dos esquemas dificultam a fiscalização.
Dois órgãos são os responsáveis diretos pelo
acompanhamento dos sistemas de previdência: o Ministério da Previdência Social
(MPS), que é quem emite o Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP) e o
Tribunal de Contas dos Municípios ou do Estado.
No geral, por falta de equipe, os tribunais
acompanham apenas quem deixou de entregar relatórios anuais. No ano passado, o
TCM goiano fez auditoria nas contas dos municípios, mas ainda não houve
pareceres conclusivos. Relatório preliminar identificou indícios de superfaturamento
na compra de títulos públicos e de gastos e destinação irregulares de recursos
em valores que totalizam prejuízo de pelo menos R$ 6 milhões.
O MPS recebe relatórios bimestrais e realiza
auditorias indiretas ou diretas (veja quadro). A fiscalização detalhada, que
avalia o destino das aplicações, alcança menos de um quarto do total de RPPS do
País – apenas 500 municípios por ano.
A Operação Miqueias surgiu a partir de
irregularidades apontadas pelo MPS, com inquérito instaurado na Polícia Federal
no dia 31 de janeiro deste ano. O relatório do ministério apontava aplicações
em fundos de investimento de crédito privado não rentáveis, que teriam o
objetivo de desviar recursos.
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